
Foram anos vendo aquela paisagem. Para mim era deslumbrante, enquanto para os demais, não passava de algo comum. Da janela da sala na qual eu trabalhava, eu podia ver o Corcovado, já que a minha mesa ficava de frente para ele. Lembro-me perfeitamente da sensação de bem-estar e alegria que eu sentia todos os dias ao vê-lo. Inúmeras foram as vezes em que comentei essa impressão com os meus colegas de trabalho, mas eu tinha a sensação de que eles não conseguiam ver ou sentir o que eu sentia. Para mim, era como se eu o visse sempre pela primeira vez... Rodeado pela floresta, tinha algo de fascinante... Às vezes, encoberto pelas nuvens, em outras, a chuva dava-lhe um ar diferente, mas não menos bonito. Quando o sol brilhava, ele reluzia no alto daquela montanha, e eu até podia me imaginar lá, aos seus pés.
Mesmo se tratando de um dos mais belos cartões-postais da cidade, ele também passa desapercebido para a grande maioria dos que aqui habitam.

Não os culpo por não ver. O campo visual da nossa rotina é como um vazio...
Aos poucos, quase sem perceber, vamos perdendo a percepção do mistério e do encantamento existentes no mundo. Vemos, sem enxergar. Quantas vezes passamos sem olhar para aquela flor que insiste em enfeitar o jardim por onde passamos, embora quase esbarremos nela todos os dias... Será que sabemos quem é o porteiro do prédio onde trabalhamos? o ascensorista? prestamos atenção nos detalhes por onde andamos? Talvez não...
Tudo que nos cerca, o que é familiar já não desperta curiosidade. A rotina cega, cria uma espécie de barreira que não permite a interação com o ambiente e as pessoas. Passamos a agir como robôs, às vezes até olhamos, mas não vemos. Podemos sair sempre pela mesma porta, mas se alguém nos perguntar o que vimos no caminho, não saberemos responder.

Talvez nos surpreendêssemos se olhássemos mais atentamente ao nosso redor. Há beleza por toda parte, só é preciso treinar o olhar para voltar a ver. Há tanto o que ver: gente, plantas, animais, e inúmeras coisas que insistimos em ignorar.

"...De tanto ver, a gente banaliza o olhar", escreveu o jornalista Otto Lara Resende. "Vê, não vendo". Para ver, precisamos estar com aquele olhar curioso, como o da criança que vê o mundo pela primeira vez. Elas têm olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo.
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